Se formos dar crédito a um certo Baltazar Ferreira, o Ipupiara, monstro marinho devorador de gente, deixou de existir em 1564. Esse senhor afirma categoricamente ter matado o monstro, a espada, na localidade de São Vicente, naquele distante alvorecer da nacionalidade. Para não deixar dúvida, ele descreve a criatura como tendo “quinze palmos de comprido”, toda recoberta de pelos, além de ter no focinho “umas sedas mui grandes como bigodes”. José de Anchieta, sempre interessado nos disfarces do demo, também ouviu falar no ser monstruoso, embora jamais o tenha visto, e muito menos lutado num corpo a corpo com ele. O Ipupiara, segundo o melhor entendimento, pertence à classe dos seres marinhos devastadores, como a Cobra-Grande e a Boiúna. Sem ser uma cobra, ele participa da mesma espécie na medida em que se trata de uma simples máquina de matar, apesar do epíteto que lhe aplicaram de “homem-marinho”. Um traço singular é que o Ipupiara, depois de virar os barcos ou as canoas, só se alimenta dos olhos e do nariz das suas vítimas, lançando fora todo o resto. (Um cronista mais antigo – o padre Fernão Cardim – afirma que o Ipupiara também se alimentava da genitália e das pontas dos dedos dos pés e das mãos das suas vítimas.) O Ipupiara possui fêmea, também, segundo esse mesmo cronista, de cabelos longos e formosa, uma possível antecipação da Iara loira com feitio de sereia, que tanto sucesso ainda faria. Para esse padre-cronista, o homem-peixe mata da seguinte maneira: surgido abruptamente das águas remansosas, ele se abraça à sua vítima, num espavento de respingos, “beijando-a” tão fortemente que a deixa “toda em pedaços”. Depois, dando “alguns gemidos, como de sentimento”, foge com a presa, ou abandona-a, sem mesmo dela se alimentar. Assim como mata, porém, o Ipupiara também pode ser morto de qualquer maneira, o que nos leva a dar algum crédito à pretensa façanha do sr. Baltazar Ferreira.
terça-feira, abril 21, 2020
O Ipupiara
Se formos dar crédito a um certo Baltazar Ferreira, o Ipupiara, monstro marinho devorador de gente, deixou de existir em 1564. Esse senhor afirma categoricamente ter matado o monstro, a espada, na localidade de São Vicente, naquele distante alvorecer da nacionalidade. Para não deixar dúvida, ele descreve a criatura como tendo “quinze palmos de comprido”, toda recoberta de pelos, além de ter no focinho “umas sedas mui grandes como bigodes”. José de Anchieta, sempre interessado nos disfarces do demo, também ouviu falar no ser monstruoso, embora jamais o tenha visto, e muito menos lutado num corpo a corpo com ele. O Ipupiara, segundo o melhor entendimento, pertence à classe dos seres marinhos devastadores, como a Cobra-Grande e a Boiúna. Sem ser uma cobra, ele participa da mesma espécie na medida em que se trata de uma simples máquina de matar, apesar do epíteto que lhe aplicaram de “homem-marinho”. Um traço singular é que o Ipupiara, depois de virar os barcos ou as canoas, só se alimenta dos olhos e do nariz das suas vítimas, lançando fora todo o resto. (Um cronista mais antigo – o padre Fernão Cardim – afirma que o Ipupiara também se alimentava da genitália e das pontas dos dedos dos pés e das mãos das suas vítimas.) O Ipupiara possui fêmea, também, segundo esse mesmo cronista, de cabelos longos e formosa, uma possível antecipação da Iara loira com feitio de sereia, que tanto sucesso ainda faria. Para esse padre-cronista, o homem-peixe mata da seguinte maneira: surgido abruptamente das águas remansosas, ele se abraça à sua vítima, num espavento de respingos, “beijando-a” tão fortemente que a deixa “toda em pedaços”. Depois, dando “alguns gemidos, como de sentimento”, foge com a presa, ou abandona-a, sem mesmo dela se alimentar. Assim como mata, porém, o Ipupiara também pode ser morto de qualquer maneira, o que nos leva a dar algum crédito à pretensa façanha do sr. Baltazar Ferreira.
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